domingo, 25 de março de 2012

"As Cidades Invisíveis" - O livro das muitas leituras com poucas palavras


Foi-me, há um ano talvez, recomendada a leitura do livro “As Cidades Invisíveis” de Italo Calvino. Quando me foi sugerido este título de imediato pensei que se tratasse de um livro sobre urbanismo, ainda exibindo um título cheio de estilística literária. Depois de ler a contracapa percebi logo que não se tratava de uma obra literal, no mínimo, toda ela seria uma ou muitas metáforas. Nessa mesma contracapa o autor diz “O livro em que creio que disse mais coisas continua a ser As Cidades Invisíveis". Apesar de não chegar às 200 páginas, pode-se dizer o autor diz mesmo muito. A Obra retrata, pegando em muitas pequenas descrições de cidades completamente fantasiosas, tal como o próprio pano de fundo daquilo que se pode chamar a ação – as supostas conversas entre Kublai KHan e Marco Polo, onde o veneziano descreve as cidades que conheceu nas suas muitas viagens, em descrições historicamente descontextualizadas –, a própria Humanidade, nas suas construções físicas e conceptuais
Inquilinos do Tempo - Tatiana Iliina

Arrisco a dizer que “As Cidades Invisíveis” é, quase exclusivamente, uma grande descrição retalhada por vários episódios. Nesses relatos de Marco Polo, que vai aguçando a curiosidade do Imperador Mongol com o relato de cidades cada vez mais surreais e cheias de aspetos simbólicos, concretiza em discurso direto descritivo o génio imaginativo de Italo Calvino, a sua leitura social e comportamental deste mundo. No livro há cidades para todos os gostos, feitios e estados de espírito. Há descrições de belas, organizadas, justas e solidárias cidades. Há também a descrição do oposto das anteriores. Descrevem-se também exemplo de cidades que resultam de miscelâneas e cheias de dualidades. Muitas outras de tão surreais parecem ser incompreensíveis. Em cada descrição de cidade o leitor e incitado à reflexão.
Provavelmente, por existir tanta diversidade, tanta possibilidade de leituras das palavras de Calvino é que o autor afirmou que terá sido a obra onde mais escreveu. Ou então, simplesmente as suas palavras não significam coisa alguma, ou não tinham qualquer significado direcionado inicialmente, sendo pura e simplesmente arranjos capazes de nos fazer, enquanto leitores, dar a nossa própria leitura e dar tantas almas às tantas cidades descritas como nos permitir a nossa própria imaginação. Almas essas que podem ser também elas figuras estilísticas da nossa compreensão de Humanidade.

quinta-feira, 15 de março de 2012

O estranho caso do Imperador Constantino - um cristão por convicção ou interesse?


Parece que foi séneca que disse “a religião é verdadeira para as gentes comuns, falsa para os sábios e útil para os políticos [ou governantes]”. Estas palavras são muitas vezes utilizadas de um modo avulso em debates mais ou menos teológicos/políticos (ou ateológicos/ateológicos), no entanto gostaria de dedicar aqui alguma atenção à terceira parte da afirmação desse filósofo romano para tratar um evento histórico importantíssimo para o Ocidente, desencadeado por outro famoso romano. Refiro-me a Constantino que colocou fim às perseguições do império romano aos cristãos e a sua conversão ao cristianismo no fim da sua vida.

Batalha da Ponte de Mílvio - Giulio Romano

 O episódio da Batalha da Ponte de Mílvio, com a impressionante vitória de Constantino sobre Maxnésio (ou Magnésio), é considerado um dos pontos de viragem da história do Ocidente. Consta, pelo menos em algumas das fontes - especialmente segundo Eusébio de Cesaréia -, que Constantino, em situação de desvantagem, tomou uma decisão estranha para a época: decidiu, depois de um sonho com uma cruz na véspera da batalha, pintar nos escudos dos seus soldados cruzes, de modo a supostamente pedir auxílio ao deus dos cristãos. Curioso é que o próprio Constantino não era cristão, quando jovem terá sido iniciado no culto do Sol  (ver texto sobre Invictus Dominus Imperii Romani) muito popular na época, logo era um Pagão. Curiosamente nem sequer a comunidade cristã da época era muito numerosa, muito menos na parte ocidental do Império, onde se estima, por exemplo, que os cristãos perfizessem apenas 10% da população da cidade de Roma. Ferninad Lot aponta como razões para essa estranha opção de Constantino como uma espécie acto de desespero supersticioso, uma vez que o seu opositor tinha o apoio da grande maioria dos poderes pagãos, e também porque tentava aproveitar o mito de que quem perseguisse os cristão acabava tendo um fim trágico. Dificilmente poderemos concluir, em absoluto, deste episódio quais as reais intenções de Constantino, se a sua opção terá sido movida pela , pela estratégia visionária, calculismo ou pelo desespero. Provavelmente foi um misto das três em doses muito próprias.
 O próprio continuar da história do reinado de Constantino revela alguns aspetos igualmente estranhos. Depois de um período de tolerância religiosa, à medida que o seu imperium (reinado) vai durando, começa a favorecer os cristãos, e mais para o final da sua vida a desmantelar na prática os cultos pagãos. Curiosamente só foi batizado mesmo antes da morte. Apesar disto ser habitual na época, não podemos deixar de questionar, dado que o cristianismo foi essencial para a legitimação do poder de Constantino, o porquê de um batismo tão tardio. Seria mesmo cristão? Dificilmente saberemos.
Certo era a importância que o imperador dava à unidade do Império (culturalmente e politicamente), e para o final da sua vida também à unidade do próprio cristianismo, pois nessa altura existia uma infindável quantidade de tendências e grupos cristãos distintos. Independentemente disso, Constantino fundou uma nova capital, com o seu próprio nome, que seria a Nova Roma – Constantinopla. A existência dessa nova capital contribui de facto para a separação e divisão do Império Romano em: Ocidente e Oriente. A nova capital, com o passar dos séculos tornou-se culturalmente Grega, aumentando ainda mais a separação, que transitou também para a religião e a própria Igreja. Depois do Cisma passaram a existir duas grandes Igrejas, A Romana e a Grega, aquelas hoje conhecidas, respectivamente, por Católica e Ortodoxa.
 Se Constantino tomou causas religiosas pela utilidade política só podemos especular. No entanto, parece que as suas estratégicas políticas e religiosas, independentemente das suas influências relacionais entre si, provavelmente não correram como planeado, pelo menos em parte.
 Pouco podemos concluir sobre o caso concreto de Constantino lembrando a frase de Séneca, mas este tema tem mais que matérias para longas reflexões. Pelo menos fica evidente que o assunto, relações e razões destes casos são tudo menos simples, que dificilmente se pode resumir a uma ou duas frases feitas, especialmente se forem descontextualizadas.

Referências Bibliográficas: 
A Fim do Mundo Antigo e o Princípio da Idade Média. Ferdinad Lot. Edições 70.

sábado, 10 de março de 2012

A Melhor Juventude - Um filme sobre famílias, pessoas e história recente de Itália

Por diversas vezes resisti a pegar neste filme e começar a vê-lo. Assustavam os 366 minutos, divididos em duas partes. Mas como as cotações e avaliações ao filme eram tão positivas, ainda para mais por ser um filme italiano, com verdadeiros atores italianos e a passar-se, quase na íntegra, em Itália, não podia deixar de dar uma oportunidade ao filme.
Diria, em jeito de resumo, que se trata de uma saga familiar, onde se acompanha a vida (e morte) de personagens com ligações familiares e afectuosas, entre si, ao longo de quase 40 anos. Nesse longo desenrolar, dessas vidas pessoais, que se contam no filme, conta-se também a história da Itália, e da própria sociedade Italiana, desde os finais dos anos 60 do século XX até ao início do século XXI.
Ou seja, o filme A melhor Juventude (no original "La meglio gioventù" ou em inglês "The Best of Youth") é uma experiência a não perder para quem se interessar por um filme de forte pendor descritivo das relações sociais, familiares e afectivas. Marco Tullio Giordana dirigiu este bom filme quase ao jeito de uma (boa) novela, bem escrito também por Sandro Petraglia e Stefano Rulli e muitíssimo bem representado por muitos atores italianos, tais como Luigi Lo Cascio, Alessio Boni e Jasmine Trinca. O enredo, desempenho das personagens e ambientes estão bem conseguidos - as personagens estão mesmo muito convincentes. Somente parece que não houve muito cuidado (ou orçamento) para a caracterização das personagens, especialmente porque a maioria delas são desempenhadas pelos mesmos atores ao longo dos quase 40 anos da narrativa da história - algumas perucas parece que não "assentam" bem.
Depois de ter visto o filme fiquei logo de seguida com saudades das personagens, dos ambientes sociais e históricos - ambientes que se passavam em bairros populares, nas universidades, nos movimentos políticos e sociais, nas instituições de saúde e justiça, etc.) e dos espaços (Roma, Turím, Sicília, Florença, etc.). Este filme é uma viagem à sociedade italiana e seus espaços físicos, sociais e culturais. É uma viagem cinematográfica a fazer!

segunda-feira, 5 de março de 2012

Alguns atlas para viajar até locais prováveis e improváveis



Um dia quando passava por uma livraria perto de casa dois livros da montra despertaram o meu interesse pelas suas exuberantes capas. Era evidente que se tratavam de atlas, e à primeira vista pareciam relacionar-se com geografia. Depois de entrar na livraria, e de os pegar para ver mais de perto, reparei que eram livros de viagens. Mais do que terem vistosas capas, os conteúdos eram igualmente cativantes. Um deles, intitulado de “Viagens – Onde ir e quando” pretendia traçar destinos do mundo recomendáveis a cada mês do ano. Algo extremamente útil pois quando pretendemos ir um pouco mais longe em viagem nem sempre temos a perceção sobre quais as melhores épocas para alguns sítios mais exóticos. Por exemplo poderá ser catastrófico visitar a Índia em plena época das Monções!
Cito então algumas sugestões do primeiro livro, a título de exemplo, sobre os melhores locais para visitar em cada mês com pelo menos um sítio por mês referido no livro:
  • Janeiro: Banguecoque (Tailândia)
  • Fevereiro:Egipto
  • Março: Riviera Maia (México)
  • Abril: Petra (Jordânia)
  • Maio: Creta
  • Junho: Peru
  • Julho: Copenhaga (Dinamarca)
  • Agosto: Sri Lanka
  • Setembro: Munique (Alemanha)
  • Outubro: Lassa (Tibete)
  • Novembro: Tokyo (Japão)
  • Dezembro: Helsínquia (Finlândia)

O segundo livro, por sinal da mesma editora que o primeiro - a DK ou Civilização -, de seu nome “Viagens – Os lugares menos visitados, 1000 locais fascinantes fora das rotas turísticas”, é o mais peculiar e até algo discutível para o género literário. Nesse livro os autores tentam defender a tese de que podemos escapar aos roteiros turísticos conhecidos (cheios de multidões de turistas) e visitar igualmente locais ímpares e de valor semelhante aos mais conhecidos. Esta abordagem é muito interessante e pode ser muito útil, pois revela de facto lugares que são pouco conhecidos e que são de uma originalidade e beleza merecedoras de visita. No entanto, por mais opções que possam haver, simplesmente não podemos substituir certos lugares, edifícios, eventos ou festividades por equivalentes. Podemos tentar, mas não conseguiremos e estaremos a tentar mentir a nós próprios. Pois, se a história não se repete, a singularidade de um determinado local ou acontecimento também não pode ser substituído por outro. Por exemplo, por mais interessantes que sejam, as Pirâmides de Meroé (no Sudão) elas não podem substituir a importância e incontornável obrigatoriedade de visitar as Pirâmides de Gizé – a única das 7 maravilhas do mundo antigo ainda intacta. Este é mesmo só um exemplo entre tantos, entre outros que cito de seguida:
  • Stonehege vs. Avebury
  • Acrópole de Atenas vs. Agreigento e Slinunte
  • Coliseu de Roma vs. Arena de Pula
  • Pompeia  vs.  Herculaneum
  • Chichén Itzá vs. Tikal

Críticas à parte, ambos os livros da DK podem ser deliciosas experiências visuais e informativas. São muitas também as dicas práticas a seguir nos roteiros e locais propostos a visitar. 
Pensando na contemporaneidade, e no que se passa em Portugal em especial, é nestas épocas de crise que precisamos de decidir bem os nossos investimentos, de um modo o mais informado e consciente possível, sendo que as escolhas turísticas não são exceção. Por isso, para quem pretenda viajar para o estrangeiro e goste de atlas, estes são dois livros a não deixar escapar!

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