quarta-feira, 25 de outubro de 2017

A importância das ideologias políticas nos processos de desterritorialização das mega cidades globais

O sociólogo Manuel Castells refere que a sociedade contemporânea tem tendido para uma organização em rede, sendo que essas relações tendem para uma desterritorialização. Ou seja, essas redes ultrapassam e desligam-se das fronteiras e relações territoriais, sendo facilitadas pelas novas tecnologias de informação e comunicação, mantende apenas conexões localizadas pontualmente em determinadas geografias. Essas conexões quase sempre coincidem, no território, com as cidades.

Escritório numa cidade pequena - Edward Hopper

Xiulian Ma e Michael Timberlake, no artigo “World City Typologies and National City System Deterritorialisation: USA, China and Japan”, tentam aferir se os fenómenos de desterritorialização, sentidos nas grandes cidades mundiais, surgem inevitavelmente quando as cidades atingem o estatuto de cidades mundiais. Considera-se cidades mundiais os exemplos de mega cidades de grande dinâmica, que concentram milhões de habitantes e dinâmicas de atividades que as colocam no topo do desenvolvimento mundial. O estudo baseou-se, empiricamente, nas viagens de passageiros aéreos que permitiu modelar a rede urbana nacional e internacional que se contecta a cada das cidades analisadas. As cidades mundiais estudadas foram agrupadas em três tipos, segundo a sua organização política: cidades de comércio e finança liberais; cidades de forte planeamento direcionado; cidades de papel dual que apresentam características mistas dos dois modelos anteriores. Estes tipos de gestão política urbana denotam os antagonismos de organização política e socioeconómica: liberal versus planeamento; laissez faire versus restrições de gestão pública.

Os investigadores concluíram que nas cidades mais liberais os fenómenos de desterritorialização eram mais fortes. Estas cidades reforçavam mais facilmente as redes entre outras cidades liberais internacionais que com o seu sistema regional e nacional. Nestas cidades vigoram os princípios neoliberais do livre comércio e da pós-industrialização, com um peso esmagador das atividades económicas relacionadas com serviços e finança, mais facilmente descentralizadas e móveis, que podem ser deslocalizadas para outros territórios sem grandes dificuldades mas mantendo-se como local de transferência de capitais e criatividade. Exemplos destas cidades são Nova Iorque e Londres.

Nas cidades de controlo e planeamento direcionado, apesar da atividade económica com um certo grau de liberdade, o sistema de governação exige que as empresas estejam perto dos serviços e instituições públicas para que possam ser mais eficientes. As atividades económicas nestas cidades tendem a concentrar mais indústria de forma articulada com as restantes atividades económicas, uma vez que esse tipo de sistema produtivo é suportado pelas próprias políticas públicas. Nestas cidades os efeitos da desterritorialização com a ascensão a cidades de nível mundial são menos sentidos. Uma vez que existe uma coordenação política o sistema urbano organiza-se segundo as lógicas do poder político, que neste caso tenta favorecer a territorialização de onde esse próprio poder emana. Estas cidades servem mais os seus territórios como centros políticos de desenvolvimento desses mesmos territórios. Exemplos destas cidades são Tóquio e Seul.

As cidades de modelo dual resultam de um mix de liberalização e controlo, sendo um dos exemplos de cidade mundial assim definida pelos investigadores a cidade de Shangai. Nestas cidades os efeitos da desterritorialização são menos sentidos que nas cidades onde o liberalismo é quase absoluto.

Assim, concluem os autores que as políticas de governança têm fortes impactos perante os fenómenos de desterritorialização nas cidades globais. Apesar dessas grandes metrópoles atingirem um estatuto de espaços urbano da globalização os fenómenos de desterritorialização continuam a ser fortemente influenciados pelos princípios de organização política, salientando-se a importância e peso das influencias ideológicas políticas naquilo que são as mais complexas criações humanas: as cidades.

Referências bibliográficas:
Castells, Manuel (2011). A era da informação: Economia, Sociedade e Cultura. A Sociedade em Rede. Volume I. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian.
Ma, Xiulian; Timberlake, Michael (2012). World City Typologies and National City System Deterritorialisation: USA, China and Japan. Urban Studies Journal Foundation. Sage Publications.

segunda-feira, 9 de outubro de 2017

Desde quando existe Espanha e desde quando deixámos de ser espanhóis?

Se quisermos ser precisos podemos dizer que Espanha existe apenas desde os finais do século XVI, somente quando Portugal foi incorporado na união política dos vários reinos da península Ibérica. Antes disso existiam os reinos de Castela, Leão, Aragão e Portugal. A história pode ser muito mais complexa que isso se recuarmos mais no tempo. Fiquemos por esta simplificação e vamos apenas recuar no tempo para encontrar a origem do termo Hispânia, que provém da herança latina, da ocupação romana da península a quem os romanos haviam chamado Hispânia. Mas antes deles os gregos já a conheciam como sendo Ibéria. Ou seja, foi somente quando todos os reinos estiveram sob a mesma suserania é que se passou a chamar a esta unidade política reino de Espanha. D. Filipe II, conhecido como Filipe I de Portugal, foi então o primeiro rei de Espanha.
 
Entrada de D. Filipe II em Lisboa
 
Aquando da Guerra da Restauração da independência portuguesa, o Conde Castelo Melhor, que foi quem dirigiu as negociações de tréguas em 1665, estando no trono o rei Afonso VI, conhecido pela sua incapacidade para governar, sempre recusou a possibilidade do Rei Filipe IV, conhecido como Filipe III em Portugal, pudesse continuar a utilizar o título de rei de Espanha. Isto porque denotava um domínio, ainda que simbólico, sobre Portugal. Mas com o tratado de Lisboa de 1668, já com Castelo Melhor afastado da liderança política portuguesa e com a morte de Filipe IV, Portugal aceitou que o rei vizinho continuasse a utilizar o título oficial de Rei de Espanha.

Este texto baseia-se num artigo [1] de João Casaca, membro concelheiro da Ordem dos Engenheiros, ele próprio engenheiro Geógrafo. O autor considera que até essa altura os portugueses, que sempre se tinham considerado como espanhóis, por habitarem na Hispânia, na mesma medida em que somos europeus por habitarmos na europa, deixaram de ser assumir e considerar como tal. Parece uma assunção discutível, mas deixa-nos a pensar seja como for.

Ainda antes da formação de Portugal há que lembrar o feito de Afonso VII de Castela que se tornou rei da Galiza, rei de leão, rei de Castela e de Toledo, e senhor por vassalagem de Aragão e do candado/marca da Catalunha, tendo sido considerado imperador da Hispânia a partir de 1135, depois de ter sido coroado imperador na catedral de Leon pelo Antipapa Anacleto II [2]. Nesta coroação não participou Afonso Henriques de Portugal. O título de imperador, que tudo indica ter sido meramente honorifico, deixaria de fazer qualquer sentido com o reconhecimento da independência do reino de Portugal pelo tratado de Zamora em 1143 e da União do reino de Aragão com os condados da Catalunha, nascendo por essa via a coroa de Aragão, totalmente formalizada em 1164 com elevação ao trono de Afonso II de Aragão [3].

Referências:
[1] – Casaca, João (2016). “A geopolítica e o corónimo Espanha”. Apontamento Histórico. In A Internet das Coisas. Revista Ingenium. II Série, n.º 154. Julho/Agosto 2016. Disponível em:
http://www.ordemengenheiros.pt/pt/centro-de-informacao/publicacoes/revista-ingenium/revista-ingenium-n-o-154-julho-agosto/
[2] – “Afonso VII de Leão e Castela”. In Wikipédia. Disponível em:
 
https://pt.wikipedia.org/wiki/Afonso_VII_de_Le%C3%A3o_e_Castela
[3] – “Coroa de Aragão”. In Wikipédia. Disponível em:https://pt.wikipedia.org/wiki/Coroa_de_Arag%C3%A3o

terça-feira, 3 de outubro de 2017

Armas pré-históricas que forçaram a comunicação - Documentário: O Grande Romance do Homem

O documentário "The Book of Man", da autoria de Daniel Leconte, exibido recentemente na RTP2 com a tradução de "O Grande Romance do Homem", ensaia-se uma história da pré-história da humanidade, desde os primeiros hominídeos até ao desenvolvimento da escrita, aquele momento em que, supostamente, nasce a história: fruto dos primeiros documentos escritos.
 
Homo Erectus - Zdenek Burian
 
O documentário centra-se na linguagem humana que permite a diferenciação da espécie pela complexa capacidade de comunicar. Refere-se que a linguagem será tão antiga como o Homo Erectus, isto com base na teoria de que para produzir os primeiros bifaces seria necessário um desenvolvimento cerebral e de ordenamento do pensamento para executar esse tipo de tarefa precisa, meticulosa e fruto de planeamento, que só era viável se existissem as capacidades inerentes à linguagem. Esta visão é revolucionária, uma vez que se pensava que a linguagem tivesse surgido muito mais tarde.

Leconte refere também outra curiosidade. Partindo dos casos conhecidos de outros primatas em que a predisposição para o homicídio é real, a facilidade com que os primeiros hominídeos poderiam matar os seus semelhantes, com paus, pedras ou outros utensílios toscos mas letais, criou a necessidade de comunicar e estabelecer empatia de modo a garantir segurança, isto em espécies já habituadas a viver em sociedade. Ou seja, o comunicar poderia ser mais valioso para criar empatia e garantir segurança do que propriamente para transmitir informação.

Todas estas teorias, tal como outras que são explanadas neste documentário, salientam o  grande desconhecimento sobre a nossa pré-história. Muitas conclusões resultam de explicações possíveis carregadas de grandes doses de incerteza, mas particularmente educativas, uma vez que muito falam e tentam explicar o porquê da nossa diferenciação enquanto espécie e a origem de comportamentos que ainda hoje apresentamos e manifestamos.
 
Ver documentário:
 
 
 

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