terça-feira, 3 de março de 2015

Quando os Museus Esmagam os Visitantes - Introdução à Nova Museologia

Quem já não se sentiu esmagado ao entrar num museu? Paul Valéry já alertava, no início do seculo XX, para essa problemática. Para Valéry seria impossível a algum visitante apreciar, desfrutar e sequer ler devidamente a quantidade imensa de material e espólio apresentado pelos museus de então. Faz essa crítica no seu ensaio (Valéry, 1960) a propósito de uma visita ao Louvre, onde critica a quantidade excessiva de obras expostas, tanto em número como no modo como se “acotovelam” nas várias salas.
Tribuna de Uffizi - Johan Zoffany
No que toca a questionar o papel e limitações dos museus não podemos esquecer o ensaio de André Malraux, ainda que tivesse ensaiado especialmente sobre os museus de arte (Malraux, 2013). Para Malraux o conceito de “Museu Imaginário” vem colocar em causa o conceito tradicional de museu, uma vez que nenhum museu conseguirá ter todas as peças, todas as obras e todo o espólio para mostrar num determinado tema ou assunto, sendo até difícil enquadrar em toda a plenitude os objetos analisados individualmente com os espólios que possuem. Assim, para Malraux, recorre-se à colmatação e a criação dos museus imaginários que resultam do estudo e conhecimento lato, que criam os envolvimentos em falta. Estes “museus imaginários” seriam complementados pelas formas e métodos que influíssem na mente as obras e património extra, criando um novo museu virtual em cada pessoa. Um desses modos, pensava Malraux, seria a fotografia. Através dela, da sua análise, poderíamos ter acesso a mais informação e ir construindo o nosso museu imaginário. No entanto, a existência de museus e a sua utilidade não ficaria em causa, mas haveria de se ter a noção que os museus físicos mostravam apenas uma visão parcelar dependente de constantes colmatações. A solução técnica que Malraux encontra nos anos 60 para a construção destes museus “completos” é a fotografia. Posteriormente, os desenvolvimentos tecnológicos, especialmente os das tecnologias de informação e comunicação (TIC), permitiram levar os conceitos de “museu imaginário” a um novo patamar, tal como contribuir para revolucionar a museografia.


Mas nas últimas décadas ocorreram mudanças sociais bastante importantes. Aquilo que Valéry criticava na museografia e o novo conceito que Malraux criou de museu vieram a contribuir, entre muitos outros, para mudanças na posterior museografia. J. Amado Mendes (2013) diz: “O Museu, instituição pública acessível a todos os tipos de públicos, é um fenómeno recente […] Passa-se de uma política museística, centrada no objeto, na sua aquisição e na conservação, para uma política centrada nos sujeitos que dele podem usufruir”. E o autor vai ainda mais longe ao referir que alguns autores afirmam que, “para avaliar a relevância de um museu, não se deve perguntar que coleções tem, mas o que faz com o acervo de que dispõe”. Este enfoque remete para a dicotomia e oposição entre o museu armazém/depósito e as correntes da “Nova Museologia”, direcionadas para a experiência dada ao público e para a aprendizagem ao longo da vida, capaz de chegar a todas as idades e grupos sociais.

Pensando nas afirmações de Amado Mendes, e recordando aquilo que Valéry e Malraux já ensaiavam de modo erudito, podemos refletir sobre o papel contemporâneo dos museus. Quantos estão realmente preparados e realmente dedicados aos visitantes? Quantos destes conseguem criar experiências cativantes e contribuir para a educação ao longo da vida dos visitantes? A “Nova Museologia” vai ganhando peso. Resta saber se depois teremos algum museu dos museus (museu tipo armazém ou outro), pois os novos museus pouca relação terão com os antigos, pois neles pode até não haver qualquer acervo patrimonial de relevo.
Referências Bibliográficas
  • MALRAUX, André. O Museu Imaginário. Lisboa: Edições 70, 2013.
  • MENDES, J. Amado. Estudos do Património – Museus e Educação. 2ª Edição. Coimbra: Imprensa da Universidade de Coimbra, 2013.
  • VALÉRY, Paul. Le problème des musées. In: HYTIER, Jean (Ed.). Paul Valéry – Oeuvres II. Paris: Éditions Gallimard, 1960, p. 1290-1293.

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