quarta-feira, 22 de dezembro de 2010

O que é a Bolsa, e será que precisamos dela?

Numa altura que todos já andamos de bolsa vazia à conta das socialmente obrigatórias prendas de Natal, pareceu-me adequado abordar aqui o tema da Bolsa - a de valores, aquela que nos entra em casa pelos noticiários sem percebermos muito bem o que é. Na verdade, trago aqui o tema da Bolsa simplesmente porque descobri um texto pertinente sobre o assunto, da autoria do economista Frédéric Lordon e presente na edição portuguesa de Fevereiro de 2010 do Le Mode Diplomatique.
Governadores da guilda dos mercadores de vinho - Ferdinand Bol

Nesse texto, intitulado de «E se encerrássemos a Bolsa?», o autor critica as instituições Bolsistas e as operações que nela se fazem. Refere que essas actividades são de importância menor pois a maioria do emprego real e das empresas não estão cotadas em Bolsa e nem sequer têm relações directas com elas - o caso das PMEs portuguesas. Lordon revela algum dos seu radicalismo - mesmo que seja apenas estilística do próprio discurso - ao defender que poderíamos bem passar sem as Bolsas, especialmente porque hoje elas não servem o seu propósito fundamental e funcional: financiar as empresas e obter dividendos sustentáveis para os accionistas.
Mas o que me cativou especialmente neste texto é a simplicidade como se explica o que é a Bolsa e os seus objectivos. Vejam-se então as palavras do próprio Lordon:
"Certos agentes (as pessoas com poupanças) dispõem de recursos financeiros em excesso que procuram aplicações, ao mesmo tempo que outros  agentes (as empresas) procuram capitais; a Bolsa seria a forma institucional idónea que poria em contacto toda essa gente, efectivando o encontro mutuamente vantajoso das capacidades de financiamento de uns com as necessidades dos outros."
No entanto, Lordon, chama a atenção para as realidades e práticas nos Mercados Bolsistas, algo que anda longe do crescimentos e prosperidade económica sustentável que se pretendia - na prática, muitas vezes,  são as empresas que financiam a Bolsa e não o contrário. Lordon diz:
"Doravante, o que sai das empresas para os investidores [que exigem actividades de rendibilidade inalcançável] é superior ao movimentado em sentido inverso (...). Os capitais reunidos pelas empresas tornam-se inferiores aos volumes de cash sugados pelos accionistas e a contribuição líquida dos mercados de acções para o financiamento da economia tornou-se negativa."
Mas ainda falta considerar aqui o efeito da especulação, que,  segundo Lordon se relacionam com a sua anterior afirmação do seguinte modo: "Não havendo novas emissões de acções para absorver os referidos [anteriormente] volumes financeiros , estes limitam-se a engrossar a actividade especulativa".
As palavras do autor adensam-se ainda mais no tema das "Bolsas e Mercados Financeiros", mas o que salientava ainda do texto é a referência que se faz  ao evidente sentimento de estranheza e intangibilidade que estes temas provocam na opinião pública.

Nós que não somos economistas e que, quase todos os dias, somos bombardeados com as "coisas dos Mercados e das Bolsas", provavelmente, estaríamos bem melhor - pura especulação psicológica e social - se não nos chegassem todos os dias  informações, aparentemente negativas, que dificilmente podemos compreender - pois não podemos ser todos economistas. 
Não digo encerrar  mas poderíamos exigir o resfriar do alarmismo económico e bolsista que nos chega através dos Media todos os dias aos nossos lares.

sábado, 18 de dezembro de 2010

D. Quixote - o romance que satiriza o próprio romance

A obra «D. Quixote de La Mancha» é a obra prima de Cervantes e o livro laico mais impresso em todo o mundo. Cervantes quando escreveu esta sua obra, baseando-se na sua própria experiência e aventuras pessoais dramáticas - ora intensas e de aventura, ora de inércia e marasmo -, criou um género novo que rompia com o que se fazia na época, aliás, criou algo que criticava e que era uma sátira à literatura popular de então - aventuras e contos cavalheirescos onde destemidos heróis provavam a sua coragem e força, superando provas e obstáculos impossíveis, culminando quase sempre no salvamento de uma donzela encarcerada.
D. Quixote e a mula - Honoré Daumier
Assim, o autor de "D. Quixote", segundo o documentário "Cervantes e a Lenda de D. Quixote" da autoria de Daniel e Jaume Serra, escreveu este conto como critica àquilo que considerava ser baixa literatura: os contos e novelas de cavaleiros - por serem livros produzidos em massa sem cuidados mínimos na forma e conteúdo, desfasados de realidade e que serviam apenas para entreter sem nada transmitirem de verdade.  Em pleno século XVII, estando Espanha no seu auge, Cervantes, através da sua sátira, que foi muito além da mera crítica, redefine, involuntariamente - ou não -, o modelo literário daquilo que seriam os posteriores Romances: cria a figura do herói como manifestação que retrata a condição e limitações humanas; descreve e apresenta ideais e valores - incluindo as utopias - de indivíduos e sociedades através das suas personagens e ambientes; mistura humor e drama, os condimentos de uma história bem realista pois é assim que a vida de facto é, uma mescla de "bem e mal", de alegria e tristeza, sucesso e insucesso; e até, dizem os autores do documentário, concretiza pela primeira vez em personagens literárias os arquétipos da dualidade antagónica das parelhas de heróis, algo que será copiado e readaptado posteriormente na literatura e cinema (por exemplo: "Sherlock Holmes e Dr. Watson", "Bucha e estica",  entre muitos outros - basta pensar um pouco e logo muitas outras parelhas nos surgem).
Em jeito de resumo, Cervantes, com o seu D. Quixote de La Mancha (historia de um velho meio louco que se torna num cavaleiro andante, acompanhado pela voz da razão que é Sancho Pança, sempre à procura de aventuras, de defender os fracos e oprimidos, e de salvar a sua Dulcineia), para além de criticar um modelo de literatura do seu tempo que considerava inferior, redefine o modelo em que se irão basear posteriormente algumas das grandes obras do Romance e da Ficção Literária dos séculos subsequentes.

Agora pergunto eu - falando de arte e cultura -, será que alguém conseguirá pegar neste exemplo de acção criativa de  Cervantes e transformar algum "lixo" que nos invade em algo de novo e de qualidade?
Uma reciclagem cultural hoje provavelmente também não seria de todo despropositada a meu ver, pelo menos para alguns casos.

segunda-feira, 13 de dezembro de 2010

Espadas Papais - o poder politico/religioso e as espadas

As Espadas, pelo menos desde o final do Império Romano do ocidente, quando as culturas nativas do centro e norte da Europa começaram a redefinir o que seria posteriormente o Ocidente, tiveram, para além do cariz militar, uma função de distinção social para quem as possuía.  
Homem sentado com uma espada e flor - Picasso
 Soberanos, descendentes das antigas tribos a quem os Romanos chamavam Bárbaros e que criaram os seus próprio reinos no vazio político que se formou a seguir à queda do império, praticavam uma espécie de Culto da Espada. Usualmente, esses Reis ou Senhores poderosos locais, ofereciam espadas como sinal de distinção para com os seus vassalos que lhes prestavam grandes e meritórios serviços - basta lembrarmo-nos do episódio de "armar  um cavaleiro", algo tão recorrente, por exemplo, no cinema histórico.  A Espada, nessa altura, estava associada à nobreza de carácter, estatuto social e até à virilidade - nas sociedades ocidentais europeias que se formaram no inicio da idade médias, os guerreiros (nobreza) estava no topo da pirâmide social.
Muitos heróis medievais, ou pré-medievais, míticos ou inspirados por personagens reais, foram imortalizados pelos romances cavalheirescos medievais. Até nós chegaram também o nome das suas espadas - sinal da importância destas ferramentas de fazer guerra e pelejar. Por exemplo: Siegfried lutava com a sua Balmung, Ogier com a Courtain, El-Cid com a Tizona e o Rei Artur com a famosíssima Excalibur.
Mas o uso das Espadas, enquanto atribuição de uma espécie de "medalha de mérito", não estava apenas generalizada pelo soberanos ditos laicos. O Papado, o herdeiro da burocracia e cultura do Império Romano do Ocidente - o único poder internacional que conseguia dar alguma unidade ao mundo Medieval Feudal -, entre o século XI e XIX atribuiu as suas próprias Espadas Papais. As Espadas Papais caracterizavam-se por  ser "armas de lâmina longa usadas por pontífices como símbolo de respeito e admiração por parte, essencialmente, dos chefes militares que estes julgavam merecedores do título de "defensores da fé" (...)"(2). Consta que "era tradição que as espadas fossem benzidas pelo papa no dia de Natal, e, durante séculos, era raro que este dia passasse sem que algum governante ou herói militar fosse honrado desta maneira" (2). O culto das espadas estava muito enraizado, tal como a sua ligação à Igreja Católica (ou por outro lado, a igreja é que também se associou ao cultos dos descendentes das tribos bárbaras - uma aculturação, intencional ou não), que, através da sua estrutura burocrática - que poderíamos ver como um espécie de continuidade do império romano do ocidente - a quem todos, apesar de terem alguma autonomia política, deveriam respeitar e prestar tributo físico e espiritual.
Claramente, hoje as Espadas ainda são vistas como objectos de distinção, mas não me parece que, numa sociedade em que o catolicismo (ou outro tipo de cristianismo) supostamente se separou do Estado e que essas mesmas religiões apelam agora à paz e ao fim dos confrontos armados - pelo menos as religiões maioritárias praticadas no Ocidente -, fosse aceitável que se oferecesse, como sinal de distinção religiosa, algo relacionado com as artes bélicas. Mas não nos podemos esquecer que as espadas sempre foram mais do que instrumentos de corte ou estoque

Fontes: 
1 - A queda de Roma e o fim da civilização - Bryan Ward-Perkins  
2 - Espadas, Adagas e Alfanges - Gerard Weland

quinta-feira, 9 de dezembro de 2010

«A corrupção e os Portugueses» – o livro que inspirou uma petição

Hoje assinala-se o «dia Internacional de luta contra à Corrupção». Por isso, nada mais adequado e pertinente do que trazer aqui ao blogue uma espécie de análise/resumo de um livro que, para além da aquisição de saber que proporcionou, inspirou a criação de uma petição – que pretende propor uma nova abordagem de combate a esse mal social que é a corrupção. A petição em causa, intitulada de “Combate à corrupção através da consciencialização, informação, formação e educação”, surge da convicção - e para mim premissa válida - que a informação e educação podem ser utilizadas para fazer reduzir a corrupção. Seguramente que esta não é a única solução para o problema – isso seria ingenuidade – mas é uma possível abordagem e solução que tem sido sistematicamente descurada. Para além dos mecanismos jurídicos e penais imprescindíveis ao combate à corrupção – que falham sistematicamente em Portugal -, há que apostar também na prevenção através do ensino de valores e do desenvolvimento de uma consciencialização ética nos portugueses, especialmente nos mais novos. Já num anterior texto aqui do blogue referi o exemplo de uma aplicação semelhante que teve sucesso no nosso país: a consciencialização ambiental. De como, através da educação e formação, se conseguiu mudar o modo como os portugueses pensam e actuam sobre o ambiente. Chegou a altura de tentar fazer algo de semelhante para o combate à corrupção.
Proverbios falmengos - Pieter Bruegel
Mas passemos à análise do livro propriamente dito que é a principal razão de ser deste texto. A obra “A corrupção e os Portugueses – práticas – atitudes – valores”, da autoria e coordenação de Luís de Sousa e João Triães e que conta com a colaboração de outros investigadores, é a concretização em livro, de modo a chegar a grande público, do estudo “Corrupção e ética em Democracia: O Caso de Portugal”. Foi principalmente esta obra que me levou à tomada de consciência de que é preciso agir e fazer algo para mudar a sociedade portuguesa - o que resultou na elaboração, em conjunto com outras pessoas, da petição anteriormente referida. Voltando ao livro, os autores conseguiram nesta obra concretizar algo que nem sempre é fácil: um conjunto de textos independentes mas interligados que tratam o tema principal – a corrupção em Portugal-, recorrendo a uma linguagem acessível, devidamente enquadrada com dados estatísticos gráficos, e sintetizada por um resumo final que serve para organizar e cimentar os assuntos tratados.
O resumo final está tão bom que irei usar os mesmos títulos em que se subdivide, pois não consigo encontrar palavras mais adequadas do que as lá empregues. Quanto aos conteúdos evitarei a corrupção do plágio – o mínimo que posso fazer do ponto de vista ético, apesar da intenção aqui ser a melhor.
O triunfo da Morte - Pieter Bruegel

Concepção minimalista da corrupção
Aqui é analisada principslmente a dimensão ética do fenómeno. Os autores referem que, aqueles comportamentos que claramente violam a lei ou que estão relacionados com actos políticos são mais condenados pelo cidadão comum, independentemente de serem considerados na lei ou de terem uma interpretação duvidosa. Refere-se também que é comum os portugueses exigirem mais aos “outros” do que a si próprios, mesmo que inconscientemente.
Os Portugueses fazem mais do que a Lei o permite e menos do que a ética o exige

Mistura de Géneros
Este foi um dos principais pontos que levaram à criação da petição. Os autores afirmam que em Portugal não se definem com exactidão os limites entre as esferas públicas e privadas, ou que isso pelo menos não está bem disseminado pela nossa sociedade. Aliás, vão mais longe, defendem que os baixos níveis de formação, e uma deficiente compreensão dos fenómenos de corrupção, expõem e fazem os portugueses enveredar por práticas de clientelismo.

País de cunhas
O fenómeno cultural e social da corrupção manifesta-se aqui neste ponto. Defendem os autores que a maioria da corrupção que se pratica em Portugal é mais ao nível dos favores do que de dinheiros ou bens propriamente ditos – a dita cunha. Trata-se de um desvirtuamento das sãs trocas e sinergias sociais que deveriam promover a igualdade de oportunidades.
Aqui a cunha e a corrupção são apresentadas, para alguns elementos da sociedade portuguesa, como um modo de ultrapassar as dificuldades da burocracia da administração pública, como “um lubrificante que oleia a engrenagem do sistema” – uma actividade perniciosa que tanto prejudica o bem comum.
Algo muito caricato, e que os autores reforçam, ainda neste ponto é que este tipo de clientelismo é socialmente aceite de ser praticado pelo “cidadão comum” mas não pelo “cidadão político”, especialmente se for praticado em prol de familiares ou amigos dos agentes e actores que concretizam a corrupção – novamente a dimensão ética em causa.

O gosto pela repressão e a incapacidade de denúncia
A referência aos 48 anos de ditadura surge nesta parte, ela é referida como uma das explicações para a concepção rudimentar que os portugueses têm da corrupção, nomeadamente com o modo como os cidadãos não usam do direito de denúncia e não exercem vigilância nem condenam socialmente quem pratica a corrupção. Emprega-se aqui o termo “pacto oculto” para o fenómeno social da corrupção. “Apesar da maioria dos portugueses afirmar que denunciaria às autoridades um caso de corrupção do qual tivessem conhecimento, na realidade recolhem-se ao silêncio e à indiferença”.
A literacia e a cidadania activa, ou falta dela, são apresentadas como outras condicionantes. Os autores afirmam que “a democracia portuguesa goza de uma cidadania informada (ainda que com grandes deficiências na qualidade, sobretudo no acesso à informação), mas politicamente pouco formada” - esta referência à uma falta de formação cívica foi uma das considerações tidas na petição – que tem imensos e inquantificáveis impactos sociais e económicos no Portugal contemporâneo.

Sensacionalismo dos Media e a sede de voyeurismo dos cidadãos
Em Portugal, para os autores, não se consegue conjugar a função informativa dos Media com o devido respeito pela vida privada, especialmente a dos políticos. Isso transparece novamente numa deficiente cidadania e incapacidade de compreender e participar na política – por vezes é mais discutida a personalidade dos políticos do que as politicas que praticam. Transparece a ideia de que os portugueses têm uma visão mitológica/púdica dos seus políticos, que tendem a averiguar se os seus políticos serão pessoas como eles próprios e, invariavelmente, exigem-lhe atitudes e comportamentos éticos que os próprios não praticam. Isto é explicado também pela artificialidade com que os políticos são apresentados aos portugueses, frutos de operações de cosmética e técnicas de marketing que os tornam desumanizados.   

Aconselho convictamente a leitura integral desta obra e deixo à vossa consideração também a leitura, assinatura e divulgação da petição que resultou da leitura deste livro.

domingo, 5 de dezembro de 2010

20.000 visitas ao blogue - mais um marco, neste caso um bolivar

Pois é, o blogue acaba de registar 20.000 visitas. Não poderei "festejar" o acontecimento do mesmo modo como o fiz anteriormente - já não existe valor de notas de escudo que cubram todas as visitas. Mas, como a blogosfera não tem fronteiras, e o conhecimento não o deve ter também, utilizarei agora a divulgação da "arte" das notas de outras paragens, de outros países. Então aqui vai uma nota de 20.000 bolivares como símbolo e agradecimento ao leitores e participantes aqui nos blogues.
Muito obrigado pelas vossas visitas e contributos que têm enriquecido esta "busca"!
Nota 20.000 bolivares de 2000 em homenagem a Simón Rodríguez

Perder biodiversidade é muito mais do que perder fauna e flora

“A biodiversidade é a natureza em todas as suas formas”
Esta frase com que inicio este novo texto do blogue consta do artigo “Biodiversidade – o nosso “ecossistema” de suporte vital “, da autoria da AEA – Agência Europeia Ambiental. Este artigo chegou-me através de uma colega das andanças académicas - desta última aventura que foi a “energia e ambiente” - por isso agradeço-lhe já, pois a sua sugestão enquadra-se perfeitamente nos temas e assuntos que normalmente trato no blogue. 
Curva do rio Epte perto de Giverny - Monet
Então, nada como começar por perceber o porquê da defesa da biodiversidade ser tão importante para todos nós, e não algo de importância menor e que interesse apenas a estudiosos e apaixonados pelas questões ambientais.

“A palavra biodiversidade resulta da combinação de duas outras palavras: “diversidade” e “biológica”. Este termo representa a variedade de todos os organismos vivos de todas as espécies. No fundo, a biodiversidade é a natureza em todas as suas formas”
Nós, espécie humana – pouco ou muito evoluídos -, somos parte da natureza e fazemos parte da sua biodiversidade, mas sobrevivemos e desenvolvemo-nos ao nos aproveitarmos de todos os demais organismos que a constituem. A partir do momento em que existe actividade humana existem impactes ambientais e podemos, directa ou indirectamente, afectar toda a restante biodiversidade – quase sempre negativamente. Agora aquilo que muitos de nós desconhecem é que o que nos rodeia, a natureza – virgem ou modificada por nós –, pode-se definir como a própria biodiversidade e o nosso próprio bem-estar disso depender: a nossa saúde, a nossa cultura e até a nossa economia. Somos completamente dependentes dos ecossistemas associados à biodiversidade.
“Um ecossistema é uma comunidade de plantas, animais e microrganismos, bem como a sua interacção com o meio ambiente”
Os vários ecossistemas prestam-nos muitos e variados serviços dos quais, muitas vezes, nem damos conta.  A esses serviços chamam-se: serviço ecossistémico. Aqui ficam alguns exemplos desses “serviços” – como se alguma vez a natureza tivesse a missão ou objectivo de nos servir! - indispensáveis para a nossa sobrevivência: “Pensem nos insectos que polinizam as nossas culturas, nos solos, nos sistemas de raízes das árvores e nas formações rochosas que limpam a nossa água, nos organismos que decompõem os nossos resíduos e nas árvores que purificam o nosso ar. Pensem no valor da natureza, na sua beleza e na forma como a utilizamos para fins de lazer.” Outros serviços ecossistémicos – especialmente os metabolismos vegetais -, na sua biodiversidade, contribuem também para o famoso sequestro de CO2, evitando que os excessos que libertamos se acumulem na atmosfera e isso provoque o efeito de estufa e as subsequentes alterações climáticas.
Ponte Japonesa e lago de lírios aquáticos - Monet

Embora os vários ecossistemas sejam bastante resilientes, a verdade é que muitos deles estão ameaçados devido à acção humana - mas também temos de ter consciência que seria muito difícil existirmos, enquanto espécie, sem que qualquer impacte ambiental daí resultasse.
Apesar da crise económica estar na ordem do dia e a sustentabilidade ser mais vista do ponto de vista financeiro, nunca nos devemos esquecer que o mundo que nos permite viver, quer seja em crise ou não, tem de ser preservado e os seus recursos bem geridos, caso contrário entraremos num "défice" e “bancarrota ambiental” irreversível. Pois, perdendo biodiversidade perdemos muito mais do que fauna e flora, perdemos o actual mundo que nos tem sustentado!

sexta-feira, 3 de dezembro de 2010

Caramel – um filme sobre mulheres de Beirute e não só

Não contava fazer nenhum texto hoje, mas depois de ter assistido ao filme Caramel – filme que vi agora mesmo sem esperar na verdade grande coisa - não pude deixar de puxar do computador e tentar descrever o impacto que em mim causou. Mesmo que seja incapaz de o fazer, fica pelo menos a divulgação de um filme que vale a pena ver.
Caramel é uma produção franco-libanesa, onde a bela Nadine Labaki é a realizadora e personagem principal. O filme trata e descreve a vida de várias mulheres, de várias idades e a viverem diferentes experiências pessoais, sociais e afectivas; mulheres que orbitam em torno de um salão de beleza que aqui é o principal cenário interior. As personagens e pequenas histórias a elas associadas que se fundem nesta obra poderiam passar-se em qualquer parte do mundo, pois, no fundo, tratam e descrevem o universo feminino. No entanto, aqui a particularidade é que a acção se passa no Libado e que a maioria das personagens principais são cristãs num país de maioria muçulmana – quer religiosa, quer culturalmente. À semelhança de outras obras cinematográficas, que nos permitem e levam a conhecer os países e realidades geográficas e sociais onde a acção se desenrola – lembro-me de «gato preto gato branco» -, em Caramel somos levados até à Beirute da actualidade (pelo menos como seria em 2007). No filme são apresentados os cenários urbanos de uma cidade particular, de um conjunto urbano que é um misto de culturas e tradições antigas. Mas o mais importante aqui são sempre as mulheres – o modo como vivem e sobrevivem às agruras e alegrias da vida contemporânea nessa Beirute.
O filme é de uma profunda sensibilidade que nos toca – independentemente do género - e a banda sonora, muito local, é uma maravilha musical. Facilmente se compreende como esta obra fez parte da Quinzena dos Realizadores no festival de Cannes de 2007.

Apenas só mais uma curiosidade para rematar e terminar: parece que em Beirute a depilação, aquela que cá se faz com cera, é feita com caramelo - em jeito de brincadeira, diria que o resultado é uma doce beleza.

quarta-feira, 1 de dezembro de 2010

A manutenção da Restauração da Independência de 1640 - a importância do planeamento

Hoje é dia 1 de Dezembro e comemoram-se 370 anos desde a Restauração da Independência nacional face a Espanha (ao império dos Habsburgos ou Filipes como por cá os conhecemos). Em 1640, neste mesmo dia, uns quantos nobres dirigiram-se a Lisboa e fizeram um golpe de estado, atirando o governador em funções pela janela, e declararam Portugal independente de Espanha, após 80 anos de união ibérica. Pouco depois seria coroado o novo rei de Portugal D. João IV e uma nova dinastia governaria um Portugal Independente. No entanto, só foi possível manter Portugal enquanto reino independente depois de rechaçar os Espanhóis na guerra que se seguiria – a Guerra da Restauração
Pintura alusiva ao golpe de 1640 - autor desconhecido
Apesar de Espanha não ter respondido imediatamente a esta revolta com força militar, pois na altura o Império dos Habsburgos estava a braços com outras revoltas (a revolta da Catalunha) e conflitos militares (a Guerra dos 30 anos), mas todos por cá saberiam que, apesar do altura  para concretizar o golpe ter sido a ideal, mais tarde ou mais cedo Portugal seria invadido. Assim que a revolta da Catalunha – que ainda hoje é parte integrante de Espanha – foi esmagada em 1648, e o domínio de Madrid restabelecido, as atenções de Espanha voltaram-se para a reconquista de Portugal.

Mas D. João IV tinha-se precavido. Neste espaço de tempo, que o oportunismo do golpe permitira, consegui levar a cabo uma monumental empreitada nacional – literalmente pôr o país em obras. Conseguiu reconstruir e modernizar muitas das cidades, vilas e fortalezas estratégicas segundo as novas e mais actuais preceitos da arquitectura militar. Num pequeno espaço de tempo transformou muitas muralhas e castelos medievais em verdadeiras praças-fortes, preparadas para resistir contra as mais modernas armas de fogo da época, especialmente contra a artilharia que tinha tornado as antigas defesas medievais obsoletas. Os antigos muros e torres foram convertidos em balcões com guaritas, bastiões e revelins. Foram criados complexos fossos em volta das fortificações. O poder da artilharia que fazia cair e desmoronar em horas as muralhas medievais que aguentaram séculos de conflitos bélicos tinha de ser parado - e foi-o na prática. 
 
 A nova arquitectura militar era revolucionária em muitos aspectos. Os muros eram mais baixos e muito mais espessos, em taludes de terra compactada com revestimentos de alvenaria de pedra ou tijolo. O traçado gerai, visto em planta, dava origem a irreverentes e intrincadas figuras geométricas, simétricas e regulares com muitas saliências e ângulos  proeminentes. Os muros em escarpa inclinada, ao contrário dos ângulos rectos verticais das muralhas medievais, e os bastiões, que em profundidade quebravam a monotonia das muralhas com os seus ângulos agressivos, permitiam que as balas dos canhões atacantes fizessem ricochete. Estas características das construções, conjugadas com fossos, que dificultavam o avanço de quem pretendia atacar estas novas defesas, e com a  correcta disposição da artilharia defensiva, criavam um mortal fogo cruzado que esmagava todos aqueles que tentassem um ataque frontal. Isto era possível mesmo recorrendo a poucas baterias e soldados.
Planta de nova brisach - Le prestre de Vauban
Foi, em parte, devido à capacidade de planear e executar estas magnificas obras de engenharia militar - que hoje ainda podemos contemplar em locais como Almeida, Valença, Elvas, entre outras cidades e vilas - por parte da nova administração de Portugal, tendo em vista e antecipando os problemas do futuro, contribuíram muito para manter a independência de Portugal perante um avassalador poder militar de um dos mais poderosos Impérios da época.

Fontes:
A Grande História da Cidade - Charles Delfante
História da Guerra, mapas da história - Ian Drury
Os mais belos castelos de Portugal - Júlio Gil
The Art of War, war and military thought - Martin Van Creveld 

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