A obra mais conhecida de Adam Smith é imensamente citada e provavelmente um dos textos mais influentes da época moderna. Diz-se que foi uma das principais construções teóricas e intelectual que terá dado suporte ao capitalismo, inaugurando a abordagem à economia duma perspetiva científica. Mas será que temos interpretado bem A Riqueza das Nações?
Estudo de cor, quadrados com círculos concêntricos - Kandinsky |
O recente documentário Capitalismo, da autoria de Ilan Ziv, faz, ao longo de 6 episódios, a história do capitalismo. Nesse documentário vários economistas e professores universitários são chamados a abordar a história do próprio capitalismo. O segundo episódio é dedicado a Adam Smith, sendo especialmente interessante o modo esse pensador é apresentado, muito menos liberal do que seria de supor.
Diz-se que a divisão do trabalho é o motor do desenvolvimento do capitalismo. Adam Smith dá o exemplo da produção de alfinetes, de como, através da divisão do trabalho, a produção pode crescer imensamente. Mas depois conclui que é um péssimo sistema do ponto de vista humano, estupidificando os trabalhadores e retirando-lhes humanidade. Poucos parecem ter lido a Riqueza das Nações para além das primeiras centenas de páginas.
Outro ensinamento de Smith é o do empreendedorismo individual. Quando um empreendedor desenvolve o seu interesse próprio contribui mais ainda mais o interesse coletivo, diz Smith. Mas só considerava esse princípio do capitalismo válido quando compatibilizado com os princípios morais. Adam Smith só deixou duas obras completas, destruiu todos os seus textos que considerava ser inferiores. Para além de A Riqueza das Nações escreveu também A Teoria dos Sentimentos Morais. As duas obras eram complementares e não deveriam ser analisadas separadamente. Sabemos que o foco nos interesses pessoais tem como efeito ignorar uma visão abrangente da envolvente. A não preocupação ou secundarizar tudo o resto gera problemas sociais, ambientais e outros, já para não falar das falhas éticas e morais que denota.
Mas o termo mais emblemático de Adam Smith é a “mão invisível”, uma das grandes metáforas usadas na economia. O seu criador apenas usou a expressão uma vez em todo o texto de A Riqueza das Nações. Parece que a frase está fora de contexto, pois no texto é aplicada a um exemplo particular. Smith fala do caso concreto dos investidores locais serem levados por uma “mão invisível” a investir na sua terra, por estar mais perto e ser mais seguro quando não seja espectável terem lucros maiores mais longe. Essa “mão” seria uma segurança para a economia local e nacional perante a liberalização dos mercados. Isto é oposto ao significado utilizado correntemente. Ficando ainda mais fragilizada a sua aplicação num mundo globalizado. A metáfora da mão invisível serviu primeiro como argumento para lutar contra o feudalismo e o antigo regime. Agora serve para lutar contra o Estado Providência.
Por fim, as últimas questões. Será possível contrariar o mercado livre? Será questionável sequer? Provavelmente diremos que não. Mas, tal como se afirma no documentário, se pensarmos no trabalho infantil e outras problemáticas facilmente chegamos ao ponto de negarmos e repudiarmos essa liberdade total. Será então o mercado livre uma utopia a evitar?
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