Diz-se que a história pode ser memória, mas na prespetiva coletiva que resulta da coincidência e partilha das memórias individuais subjetivas. A história tentará escapar a essas fragilidades da memória, mas as ligações existem sempre, nem que seja pela nossa consciência atual e memória ir beber também alguns dos seus conteúdos à história.
Bem, isto tudo para relembrar um episódio de história que se liga à realidade política contemporânea portuguesa.
Cartaz alusivo à Frente Popular Francesa |
Em 1936 formou-se em França o governo da Frente Popular. Os efeitos da Grande Depressão massacravam mais uns países que outros, mas muito poucos lhe escapavam, especialmente as democracias liberais como a francesa. Entre 1930 e 1935 o número do desemprego em França subiu de 12.000 para 500.000. A crise eternizava-se sem que as políticas deflacionistas dos governos liberais conseguissem reverter a situação.
Tanto a esquerda como a direta mais radical contestavam os governos liberais de então. A esquerda mais moderada pedia soluções inspiradas em Keynes, no New Deal, e no intervencionismo e regulação da economia. A direira tendia para as soluções fascistas, enquanto que a extrema esquerda pendia para os movimentos revolucionários, comunistas ou outros.
Desse caos e instabilidade política surgiu então uma novidade política improvável. Surgiu a Frente Popular: uma ampla coligação de esquerda. Estavam incluídos partidários comunistas, socialistas e radicais sob o lema: "Pelo pão, pela paz e pela liberdade". Apesar das clivagens históricas entre as várias fações de esquerda, a coligação formou governo e governou de facto mudando a história. Propôs-se como objetivo principal deter o avanço fascista em França, de modo a evitar o que acontecera na Alemanha e Itália.
Apesar desta união de esquerda, os comunistas estiveram ausentes dos governos, o que não impediu a coesão do projeto político de ampla coligação.
A Frente Popular foi responsável por notáveis impulsos na legislação social, reforçada e apoiada pelas grandes mobilizações grevistas que envolveram civicamente a classe trabalhadora. Foi um momento simbólico de libertação social. Isso forçou o patronato a pedir ao Governo uma mediação para o conflito que resultou nos "Acordos de Matignon".
Os novos acordos permitiram assinar contratos coletivos de trabalho entre empregadores e assalariados, em que se aceitava a liberdade sindical e se previam aumentos salariais. Pouco depois surgiram novos diplomas que implementaram as 40 horas de trabalho semanal e 15 dias de férias pagas por ano a todos os trabalhadores. Estas medidas permitiram criar um clima de paz social e combater a crise económica. Aumentou o poder de compra e criou-se mais emprego devido à diminuição dos horários de trabalho.
Tudo o que aqui foi referido resulta de uma decalcação quase integral do manual de História 12ºA - O Tempo da História, da Porto Editora, adotado para o ensino formal em Portugal. Não se trata de uma peça de propaganda ideológica. Longe disso, é apenas história factual e conhecimento geral definido como importante para o percurso escolar nacional. Este conhecimento, mais que a dimensão escolar, é também útil por questões cívicas e políticas para a população em geral. Mas para isso é necessário que faça parte da memória coletiva e não apenas uma matéria a decorar pelos estudantes do ensino secundário.
Sem comentários:
Enviar um comentário