Haussman, o Barão, foi perfeito de Paris no reinado de Napoleão III que instituiu o segundo império. Liderou a gestão da cidade de Paris entre 1853 e 1870, implementando um programa que pretendia estabilizar mas igualmente modernizar a cidade, seguindo os duplos impulsos do novo imperador. Odiado por muitos na época, mas sem a visão deste homem Paris hoje seria algo muito diferente. Transformou a cidade, à custa de um elevado grau de destruição urbana. Do tecido medieval de Paris pouco ficou. Abriram-se grandes avenidas, espaços públicos e a cidade ficou mais fluida e arejada. Na época vigorava a necessidade de normas de higienização e sanitárias, uma vez que as grandes metrópoles, e principalmente Paris, eram focos de doenças e insalubridade, tal como infindáveis problemas sociais. Com essa intervenção, mas também por ser a capital de um dos mais poderosos estados europeus, Paris foi a cidade dominante a nível mundial durante todo o final do século XIX.
Lamartine, em frente à câmara municipal de Paris, recusa a bandeira vermelha, em 1848 - Félix Philippoteaux |
Ainda hoje Haussman é criticado pelos defensores do património urbano por ter destruído a morfologia medieval urbana de Paris, no entanto consta não ter destruído qualquer monumento relevante, ajustando os traçados ao edificado histórico mais importante. Obviamente que não poupou as construções vernáculas e populares. Ficamos ainda hoje com essa dupla sensação de amor ódio, de apreciarmos hoje a Paris de Haussman, com os seus novos prédios de época, mas com pena de não desfrutarmos do que seria uma das maiores cidades medievais de sempre. Ainda podemos encontrar alguns traços da estrutura urbana medieval, especialmente na zona do Quartier Latin, perto das zonas urbanas ocupadas pela antiga universidade. No entanto, mesmo essa parte da cidade, foi sendo modernizada.
Mas tudo isto para falar da dimensão política do desenho e funcionalismo urbano. Haussman viveu numa época de grande instabilidade política, em que Paris era recorrentemente o foco de manifestações, golpes e revoluções. Aliás, ele só chega ao comando de Paris pela ação revolucionário de Napoleão III. Diz-se que o plano de renovação urbana de Haussman tinha também outra intenção, de abrir os arruamentos para impedir as barricadas e apoio urbano aos revoltosos. Com facilidade de movimentos nas grandes artérias as tropas do regime podiam facilmente intervir, e seria muito mais dificil criar zonas defensivas ou condicionar a circulação urbana pelo revoltosos. Não podemos afirmar isso com certeza, embora possamos ler isso nas entrelinhas dos planos e das soluções práticas. O certo é que as revoluções em Paris deixaram de ocorrer da mesma forma desde então.
O modelo de urbanismo de Haussman generalizou-se por muitas outras cidades, seguindo-se múltiplos ímpetos que tentaram higienizar e desafogar os tecidos urbanos, dando continuidade a alguns projetos de urbanismo do período do absolutismo, em que monarcas quiseram deixar a sua marca urbana através da monumentalidade dos edifícios públicos, praças e avenidas.
As novas intervenções inspiradas na gestão de Haussman vieram forçar a pensar na cidade como um todo. Não foi por isso que se deixaram de fazer manifestações e revoluções, mas passou a exigir-se outra escala. Por isso, curiosamente, até me arrisco a dizer que Haussman criou as condições para que os movimentos sociais tivessem mais impacto nas cidades, pois aumentou-lhes a fasquia. Dificilmente alguém planearia algo pequeno depois.
Algumas referências bibliográficas de apoio:
Chueca Goitia, F. (1985). Breve historia del urbanismo (No. 307.7672 C4).
Delfante, C., & Feio, L. M. C. (2000). A grande história da cidade: da Mesopotânia aos Estados Unidos.
Mumford, L. (1998). A cidade na história: suas origens, transformações e perspectivas (p. 67). São Paulo: Martins Fontes.
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