A democracia direta foi sempre aquele ideal inalcançável, pelo menos numa grande escala. Filósofos como Stuart Mill advogavam que seria a mais perfeita forma de liberdade democrática, cada cidadão poder decidir por si. No entanto, tal visão tem sido impossível de concretizar. Esses modelos foram ensaiados em alguns locais contidos e em curtos períodos. Temos o caso da efémera comuna de Paris, que em 1871, que durante alguns meses conseguiu manter uma forma revolucionária de sufrágio direto. Algumas comunidades anárquicas adotaram também estes modelos, mas foram casos igualmente efémeros. Ao longo do século XX foram surgindo casos destes, aqui e ali, mas sempre sem ameaçarem os sistemas políticos vigentes, quer fossem monarquias, democracias ou ditaduras.
Um entertenimento de eleições - William Hogarth
No entanto isto pode vir a mudar no futuro. César Hidago propôs um conceito revolucionário: a democracia aumentada (Augmented Democracy). Tal como somos auxiliados por algoritmos, software, máquinas e inteligência artificial todos os dias, Hidalgo propõe que estas ferramentas nos possam ajudar também a mudar a democracia, tornando-a mais direta, reduzindo a necessidade de representação por outrem. O que se propõe é uma reflexão, mas, no fundo, uma substituição mais personalizável. No fundo seremos na mesma representados, mas por avatares que nos vão replicar virtualmente, para que possamos participar ativamente em todas as dimensões da vida política. Isto tem tanto de fascinante como de assustador.
Apesar de haver perigos imensos, considerar a tecnologia como forma de aprofundar o modo como os cidadãos exercem os seus diretos políticos e cívicos pode ser a solução para a atual crise democrática. A democracia, tal como a conhecemos, também beneficiou do desenvolvimento tecnológicos. Mas neste caso, a dúvida é maior que a dos indecisos ou dos abstencionistas. Seguramente teremos de tomar uma posição sobre isto.
Referências:
Altman, D. (2010). Direct democracy worldwide. Cambridge University Press.
Perez, O. (2020). Collaborative е-Rulemaking, Democratic Bots, and the Future of Digital Democracy. Digital Government: Research and Practice, 1(1), 1-13.
Simões, M. C. (2013). John Stuart Mill: utilitarismo e liberalismo. Veritas, 58(1).
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