quinta-feira, 20 de fevereiro de 2014

Da Igreja Militante à Igreja Triunfante – Acaso ou Premeditação?

Exorcismo dos Demónios em Arezzo - Giotto
De um ponto de vista arquitetónico pode ser muito interessante estudar o modo como evoluíram, e se foram transformando, os edifícios construídos pela Igreja Católica. Para além das transformações resultantes da evolução técnica e tecnológica das construções, da arquitetura e engenharia, existe uma mudança ideológica que acompanhou a materialização dos edifícios. Isto para o período Medieval.
Uma igreja românica, com o seu aspeto pesado, maciço e denso, onde algumas das construções se assemelham muito a castelos e fortalezas, transmite – segundo Gombrich* – a ideia de uma instituição militante. A Igreja, nesses tempos medievais, impunha-se entre terras de camponeses e guerreiros, muitos deles recentemente convertidos. Logo simbolizavam a luta de Deus contras os males do mundo, e também um porto de abrigo em zonas de elevada insegurança. Eram a manifestação de uma Igreja pronta a lutar ao serviço de Deus. Curiosamente, as limitações construtivas, ainda com recurso a espessas paredes, com janelas que mais se assemelhavam a seteiras, todo o suporte em massivos arcos de volta perfeita, e as ameias nas coberturas e torres sineiras pareciam acompanhar a posição ideológica da “guerra religiosa” simbólica.
Com o desenvolvimento do estilo gótico, assente em estruturas muito mais leves, capazes de grandes vãos, e seus arcos quebrados, e com magníficos vitrais que iluminavam os interiores de um modo nunca visto, transmitem a ideia – novamente segundo Gombrich* – de uma instituição triunfante. Estilo que fica ainda mais exuberante com os rendilhados e trabalhados em pedra do gótico flamejante. Ou seja, na população o cristianismo estava já amplamente implementado, sendo que a afirmação da glória da igreja podia ser manifestada com segurança, contribuindo para um aprofundamento da espiritualidade que se podia obter através dos novos espaços imponentemente iluminados. Aqui também o desenvolvimento da arquitetura e engenharia de construção seguiram lado-a-lado a ideologia da instituição em causa, uma vez que até então tinha sido impossível construir edifícios tão grandiosos, com tanta leveza e verticalidade.
Resta saber o que terá dependendo do quê: se a técnica construtiva surgiu como concretização da ideologia religiosa ou se foi a descoberta da técnica a levar à mudança ideológica. Ou então ainda há a opção de não ter sido nada disso, não havendo qualquer relação. A distância que nos separa desses acontecimentos pode simplesmente contribuir para uma visão de ordenação casuística difícil de evitar. Afinal de contas é algo natural em nós pois procuramos sempre construir relações de causa-efeito e ignorando a casualidade extrema. Gostamos de ordenar o mundo, talvez para nos sentirmos mais seguros, mesmo que seja necessário construir edifícios conceptuais vários desprovidos de relação com o real.

* GOMBRICH, E. H., A História da Arte, Lisboa, Ed. Público, 2005

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