terça-feira, 21 de fevereiro de 2017

A transformação dos partidos em oligarquias sujeitas a corrupção

São poucos os livros de âmbito geral sobre ciências políticas em Portugal. Um deles é o livro “Curso de Ciência Política” de Gianfranco Pasquino. Nele, o autor italiano invoca o modelo oligárquico de Roberto Michels para introduzir alguns do problemas e críticas democráticas e cívicas ao funcionamento dos partidos políticos (2):
 
Juramento dos Horácios - Jacques Louis David
 
Para Roberto Michels os partidos transforma-se em oligarquias através dos seguintes processos:
  • Formação de uma liderança;
  • Formação de uma liderança profissional e sua estabilização;
  • Formação de uma burocracia, de um conjunto de empregados com tarefas específicas a quem são feitos pagamentos regulares;
  • Centralização da autoridade;
  • Substituição dos fins últimos por fins instrumentais (nos partidos o objectivo passa a ser apenas a luta pelo poder, sendo criadas propostas políticas para aceder ao poder em vez de aceder ao poder para implementar propostas políticas);
  • Rigidez ideológica, ainda que possa ser aparente em alguns casos;
  • Crescente diferença e prevalência entre os interesses e/ou pontos de cista das lideranças e dos restantes membros do partido;
  • Escolha de novos líderes por meio de cooptação por parte dos que estão em funções (evitando processos verdadeiramente livres e democráticos, sem interferências das anteriores lideranças);
  • Redução das possibilidades dos membros das bases exercerem influência sobre os processos de decisão;
  • Deslocação da base formal de membros do partido para um eleitorado de apoio mais amplo.
 
Se a este modelo de Michels adicionarmos a cada vez mais dependência dos partidos de grandes fundos financeiros para realizar campanhas e de serviços externos, podemos perceber o porquê do esvaziamento dos partidos. Pois, com cada vez menos militantes por questões da construção de oligarquias internas, menos os partidos podem fazer depender as suas campanhas da mobilização voluntária militante (3). Esta dependência de serviços externos contribui para uma perda de identidade ideológica que, conjugada com a despolitização e desideologização da sociedade, obriga os partidos a competir por eleitores cada vez mais indefinidos (1). Assim os partidos ao descaracterizarem-se perdem o seu eleitorado base e menos cidadãos estão disponíveis para se identificarem com os vários partidos. A oligarquia interna e a falta de definição ideológica torna a participação inconsequente, tal como o próprio voto, sendo que a consequência e as experiências positivas são razões para a participação política e a disponibilidade para votar.

Tudo isto contribui para alimentar um ciclo ininterrupto de redução da força e da organização tradicional das partidárias. Submetem-se assim os partidos a mais riscos de corrupção, por dependerem cada vez mais de fundos externos para as suas atividades principais: a luta pelo poder (1). Perde-se também a capacidade de crítica interna nas cadeias organizativas partidárias, facilmente controláveis pelo reduzido número de militantes ativos, tal como a impossibilidade, pela falta de diversidade humana, para garantir a representatividade da população e da sociedade civil no interior dos partidos.
 
Obviamente que isto é um modelo de possibilidades, que não acontecerá em todos os partidos e que, mesmo que possa acontecer num determinado partido, não significa que todas as estruturas desse partido esteja a funcionar nesse modelo. Seja como for é algo a que os membros dos vários partidos devem estar atentos, especialmente se querem ter um futuro político mais ligado e conectado á sociedade civil e aos novos modelos de democracia mais inclusiva e participativa.

Referências bibliográficas
Fernandes, António José (2015) – Introdução à Ciência Política – Teorias, métodos e Temáticas. Porto Editora.
Pasquino, Gianfranco (2010) – Curso de ciência política. Princípia.
Sousa, Luís & Triães, João – A Corrupção e os Portugueses – Atitudes, práticas e valores. RCP Edições.

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