terça-feira, 21 de julho de 2015

Ágora – Um filme sobre um período obscuro do cristianismo

 
Muito tempo depois do que contava pude finalmente ver “Ágora”. Trata-se de uma recriação de um episódio histórico que terá mesmo acontecido. Como se diz: “Um filme baseado em factos verídicos”. Na prática tal aspeto, por si, nada garante de qualidade e interesse para a obra, pois pode muito facilmente desviar-se das fontes históricas e desinformar em vez de informar, uma vez que o formato ideal para isso seria o documentário. Mas claro, baseando uma ficção em casos reais, como é habitual fazer-se, é a possibilidade de fazer chegar conhecimento do tema ou história do filme a um público mais vasto, ainda que podendo perder-se originalidade no processo criativo, ou não fosse difícil conjugar a fidedignidade histórica com os rasgos de criatividade quase sempre deturpadores, especialmente pelo incutir de valores da atualidade e outros que tornam os filmes históricos anacrónicos.

Mas sobre o filme em concreto.” Ágora” regista as mudanças sociais, políticas, religiosas e culturais que ocorreram com a afirmação do cristianismo no seio do Império Romano, já numa fase de decadência. A ação passa-se em Alexandria, uma das cidades mais dedicadas ao ensino e conhecimento da antiguidade, nos finais do século IV e inícios de século V d.C., exatamente no período em que se considera o início do fim antiguidade tardia. Retrata-se parte da vida da filósofa Hypatia, das convulsões entre pagãos e cristãos em ascensão. É um registo em filme do choque entre o mundo antigo clássico e o novo mundo cristão que daria origem aos valores cristãos ocidentais e até à influência islâmica posterior. Grande parte destes conflitos violentos acontecem no espaço público da cidade, sendo provavelmente dai a origem do nome "Ágora" - que seria o espaço público onde acontecia a vida cívica das cidades gregas.

Existem pouquíssimos filmes sobre esta época em que se foca a violência que acompanhou a implantação e domínio do cristianismo sob o Império Romano, em que de perseguidos, e depois tolerados, os cristãos passam a ser perseguidores, contribuindo para o fim da antiguidade clássica em simultâneo com outros acontecimentos, tais como as invasões bárbaras e a posterior queda do Império Romano do Ocidente. Fica evidente como a política vivia ligada à religião e vice-versa, de como muitas opções religiosas tinham impactos e fundamentos políticos, independentemente da coerência teológica.

O filme não será brilhante no seu todo. Diria somente que é extremamente interessante. Os desempenhos das personagens são aceitáveis, destacando-se Rachel Weisz no papel principal com um bom desempenho. Parecem existir algumas pequenas incoerências no enredo e na construção de algumas personagens, mas nada de muito grave se considerarmos o ambiente e o enquadramento do filme o mais importante. O guarda-roupa, cenografia e fotografia estão bem conseguidos, especialmente a opção por algumas cenas filmadas de modo invertido, de pontos de vista diferentes e em certos planos aéreos.

quinta-feira, 16 de julho de 2015

A pintura anti-Heróica de guerra por Goya

Quando apreciamos as pinturas e telas mais conhecidas sobre combates, guerras e triunfos militares, raramente se registam os horrores e atrocidades desses conflitos. São imensas as pinturas heroicas de guerra, de heróis destemidos e exércitos vitoriosos com as suas insígnias e símbolos a reluzir. Mesmo que não sejam tão encenadas, as pinturas de guerra tentam demonstrar figuras e atos de heroísmo. A violência pode estar presente, mas quase sempre como mero enquadramento de guerra, com um morto ou outro, não muito desfigurado de modo a manter a sua dignidade.
Mas neste género de pintura destacou-se um homem singular, Francisco de Goya, que terá, muito provavelmente, sido o primeiro grande pintor a retratar os horrores e atrocidades da guerra. Goya viveu em Espanha durante as invasões e ocupação napoleónicas. Viu e presenciou o terror da guerra. Nas suas pinturas não há gloria militar. Isso é ainda mais evidente nas suas gravuras de guerra entre 1815 e 1820 (aqui apresentadas no texto com alguns dessas gravuras). Os líderes militares e soldados não são heróis, muito pelo contrário. São quase monstros ou então seres vazios de humanidade, quase autómatos descaracterizados que espalham horror.
Isso talvez tenha acontecido por Goya ter visto os seus compatriotas massacrados, mas também pelo seu natural génio que florescia pelo obscuro das suas criações. Goya aparece como o mestre do tenebroso. Habitualmente poucos encomendavam obras aos grandes pintores registando as derrotas, talvez dai esta singularidade. A obra de Goya contrasta, por exemplo, com a de Jacques Louis David, que, mais ou menos, pela mesma época se ocupava em registar com glória e pompa os triunfos militares napoleónicos.
 

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